PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS - REVISITANDO FILMES "B",
FICHA TÉCNICA
Massacre in Dinosaur Valley/ Nudo e
Selvaggio/ Cannibal Ferox 2/
Amazonas (1985, Brasil/Itália)
Direção: Michael E. Lemick (Michele
Massimo Tarantini)
Elenco: Michael Sopkiw, Suzane Carvalho,
Milton Morris, Marta Anderson, Jofre Soares,
Gloria Cristal e Carlos Imperial.
TENTE LER E ENTENDER
Imagine uma mistura entre a série Indiana Jones, as aventuras de "Tudo
por uma Esmeralda" (dirigido por Robert Zemeckis, em 1984) e o horror
dos filmes italianos de canibais, como "Cannibal Holocaust",
acrescentando ainda uma pitada das aventuras ingênuas dos Trapalhões
(brigas pastelão e gracinhas diversas) e um toque dos velhos western
spaghetti. E não é que existe uma coisa assim? A doideira chama-se PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS e foi feita aqui mesmo, no Brasil, em 1985, numa produção ítalo-brasileira dirigida por um tal de Michael E. Lemick. Apesar
da história se passar na Amazônia, as cenas foram todas filmadas na
Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro. E não se espante com o tal
"Lemick", pois não se trata de nenhum famoso cineasta norte-americano, e
sim do italiano Michele Massimo Tarantini, escondido atrás de
pseudônimo em inglês. PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS
na verdade é um daqueles filmes para públicos bem específicos: trata-se
de uma aventura tosca em ritmo de pornochanchada, misturando no mesmo
balaio canibais, aventuras na selva (com ataques de cobras, piranhas e
sanguessugas) e até um grupo de violentos garimpeiros, sempre sem se
levar a sério, apostando no humor e em tiradas absurdas, estilo história
em quadrinhos. Inclusive uma das melhores descrições que já li sobre
essa pérola classifica assim: "Uma mistura de 'Indiana Jones e o Templo da Perdição' com 'A Montanha dos Canibais'". Perfeito!
.Naquele longínquo ano de 1985, o diretor Tarantini assinou duas produções em conjunto Brasil/Itália, PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS
e "Fêmeas em Fuga" , ambos estrelados pela belíssima brasileira Suzane Carvalho. A
morena linda vinha de ensaios em revistas masculinas, como Ele &
Ela, trabalhos na TV e desfiles de escolas de samba, e subitamente
resolveu mostrar o corpão no cinema "exploitation". Também só fez estes
dois filmes e sumiu de cena, tornando-se piloto de automobilismo! Sim, amiguinhos, pode parecer incrível, mas a estrela de algo chamado PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS saiu do cinema não para o esquecimento, mas sim para se tornar a
primeira mulher a conquistar um título em Fórmula 3, inclusive tendo seu
nome registrado no Guiness, o Livro dos Recordes!!!
As atrizes principais do filme (quase todas brasileiras)
passam a maior parte do tempo sem roupa; há ainda um pouco de sexo
implícito e rápidas cenas de estupro, banho (de chuveiro e de rio) e até
lesbianismo! Tudo no filme é desculpa para tirar a roupa da mulherada,
desde bêbados chatos levantando a saia de modelos até índios tarados que
despem suas prisioneiras para o sacrifício. Ou seja, definitivamente um
daqueles filmes feitos para quem gosta de cinema com muito sangue e
sacanagem. O filme começa com um ônibus imundo
transitando por uma poeirenta estrada de chão batido, levando no seu
interior o Professor Ibanez e sua filha Eva (Suzane). Logo descobrimos
que ele é um paleontologista famoso, que está no Brasil para visitar o
Vale dos Dinossauros, bem no meio da floresta amazônica. O lugar é
famoso tanto por seu interesse histórico quanto por uma suposta maldição
indígena que o rodeia. Ibanez e Eva param na minúscula Vila de
São Sebastião e vão para o hotel, onde o carregador de malas, negro, se
chama "Maizena". No mesmo hotel também estão um fotógrafo de São Paulo,
Robi, com duas belíssimas modelos, Monica e Belina; um casal exótico de
americanos formado pelo violento, e impotente, capitão John Reines, um
veterano do Vietnã, e sua mulher bebum e clone envelhecida de Marilyn
Monroe, Beth. Quando o herói do filme entra em cena, percebemos
que não é para levar o negócio a sério. O "arqueólogo" vagabundo Kevin
Hall (o norte-americano Michael Sopkiw, em seu último trabalho no
cinema), aparentemente um funcionário do Museu de Paleontologia de
Boston, chega à vila deitado na carroceria de um caminhão cheio de
bananas, sem um único dólar no bolso e arrastando uma caixa cheia de
velhos ossos de dinossauro.
Kevin é uma espécie de Indiana Jones de terceiro mundo: malandro, cheio
de piadinhas e disposto a comer quantas mulheres cruzarem seu caminho
(neste quesito ele é o contrário do casto personagem de Harrison Ford
nos filmes da série de Steven Spielberg). Mas Kevin também tem
sangue-frio para matar as dezenas de índios e vilões que cruzam seu
caminho, e muita cara-de-pau para chegar junto na mulherada. Isso que é
herói! Ao descobrir que o Professor Ibanez planeja voar até o
Vale dos Dinossauros, Kevin fica louco para juntar-se à expedição.
Antes, entretanto, tenta dar uma de cavalheiro heróico e salvar uma das
belas modelos de um bêbado que estava tirando a roupa da moça, no bar do
hotel. Péssima idéia: o bêbado, baixinho, apanha fácil, mas tinha dois
irmãos gigantescos, que dão uma surra violenta no arqueólogo americano
(o momento "Os Trapalhões" do filme, inclusive com aquela clássica cena
em que a mão de uma pessoa é apertada e ouvimos o estalar dos ossos se
partindo!!! No dia seguinte, Kevin vai procurar o Professor
Ibanez, mas encontra algo melhor: sua filha Eva tomando banho,
completamente pelada. Uma bela forma de conhecer aquele que será seu
interesse romântico na trama. Quando ele e Ibanez entram em acordo, logo
todos estão num pequeno avião sobrevoando a Amazônia. Claro, a tal
maldição do Vale dos Dinossauros revela-se verdadeira. O avião
começa a perder altitude até cair, numa cena trash até a medula, onde
Tarantini não tem a menor vergonha na cara e simplesmente atira um avião
de brinquedo em uma ridícula miniatura da selva, enquanto filma seus
atores sacudindo dentro de um cenário precário, como se estivessem
dentro do avião!!!
Na queda morrem o piloto, o Professor Ibanez e uma das modelos. Os
sobreviventes então resolvem seguir pela selva em busca da civilização,
liderados, claro, pelo tal capitão Reines, pois ele acredita que os três
anos passados no Vietnã o credenciam a ser guia no meio da selva. A
partir de então, todas as provações da floresta são mostradas:
sanguessugas, serpentes, jacarés e piranhas. Além, é claro, de um rápido
plágio de "Tudo por uma Esmeralda", quando Reines corta os saltos do
sapato da modelo sobrevivente com um facão.E logo os
sobreviventes se vêem às voltas com uma belicosa tribo de canibais, que
quer sacrificar as moças do grupo para seu "Deus Dinossauro"
(hahahahaha), e ainda com um grupo de garimpeiros de esmeraldas,
selvagens e violentos, liderados por China, que é interpretado por
ninguém menos que CARLOS IMPERIAL (famoso cantor brasileiro e autor de
sucessos como "O Bom", da Jovem Guarda)!!!!! A partir de então, o
que era uma história sobre canibais e sobrevivência na selva se
transforma em WIP.
PERDIDOS NO VALE DOS DINOSSAUROS é um filme maluco,
roteirizado pelo próprio Tarantini e por Dardano Sacchetti (o inspirado
roteirista de nove entre 10 bons filmes italianos da época), que nem
ganhou crédito. Bastante divertido e com doses cavalares de mulher nua e de violência (incluindo coração arrancado, mutilação de seio e
perna devorada por piranhas), é a pérola perfeita para "iniciar" jovens
virgens no cinema bagaceiro italiano dos anos 80 - ironicamente, foi o
que aconteceu no meu caso. É incrível como não fazem mais filmes bobos e
divertidos assim nos dias de hoje. Na entrevista que acompanha o
DVD importado, há uma entrevista com o diretor Michele Tarantini, onde
ele explica como surgiu essa bizarra aventura: "O produtor Luciano
Martino, com quem trabalhei em vários filmes, leu em algum lugar sobre a
descoberta de pegadas de dinossauro em um vale brasileiro. E na mesma
época, nos cinemas italianos, estava passando um filme de Michael
Douglas, chamado 'Tudo por uma Esmeralda'. Pensamos em fazer uma
história parecida, mas mais violenta, para o mercado asiático.
Principalmente para o Japão, onde Ruggero Deodato e o cinema italiano
dominavam. Então adicionamos alguns elementos de canibalismo e fizemos
uma mistura de aventura, comédia, erotismo e canibais". Para
quem duvida da precariedade da produção: a tribo canibal é formada por
meia dúzia de figurantes que, mesmo quando são mortos pelo herói, voltam
à cena usando outra roupa para disfarçar; a espingarda do herói nunca
fica sem munição (e miraculosamente nunca é recarregada); as cenas da
selva são realizadas quase que totalmente em um mesmo trecho de rio
(que, graças à magia do cinema, leva o espectador a acreditar que os
personagens estão andando quilômetros e quilômetros); a "areia movediça"
é um buraco cheio de água, e por aí vai.
Isso sem contar a picaretagem de utilizar uma trilha sonora composta
para outro filme: enquanto os heróis caminham pela selva, tocam dois
temas da trilha de "Blastfighter", filme realizado no mesmo ano (1985)
por Lamberto Bava, e coincidentemente também com o ator Michael Sopkiw
no papel principal! Além de tudo isso, há cenas de briga de galo (!!!), muitos palavrões tipo pornochanchada ("Seu fudido!", "Seu filho da puta!")
e uma tonelada de abobrinhas diversas para fazer o espectador chorar de
rir, incluindo os antológicos diálogos, como aquele em que o vilão
China justifica sua maldade ("Talvez porque eu tenha tido uma infância muito infeliz... Ou talvez porque eu sou um filha da puta!"), ou o comentário de Kevin ao topar com dois irmãos cuja cor da pele é, digamos, bastante diferente ("A julgar pela cor da pele, eu diria que a mãe de vocês é uma tremenda piranha!").
Ou ainda o clássico momento em que o herói interrompe a transa com a
gostosa da Suzane Carvalho para examinar fósseis!!! Enfim, é difícil
escolher uma cena ou diálogo preferido, pois o filme inteiro é
simplesmente antológico. A propósito: apesar do título, e do nome
"Vale dos Dinossauros", não aparece qualquer dinossauro em cena, o que
foi motivo de fúria para muitos desavisados na época de lançamento do
filme!