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JOEL CAETANO - RESPONDE ÀS 7 PERGUNTAS CAPITAIS

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Através das 7 perguntas capitais eu conheci o mundo, literalmente. Consegui conversar com pessoas que eu jamais imaginaria que seria possível. Foi um projeto incrível. São apenas 7 perguntas, mas que fornecem um pequeno mosaico da carreira e paixão do entreviado (a) pelo cinema.

E hoje, com vocês, o cineasta Joel Caetano

Boa sessão:


1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS que faziam parte do nosso cotidiano.  Você é um apaixonado por cinema? Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte.

J.C.: Em primeiro lugar, gostaria de dizer que é um prazer participar! Obrigado pelo convite.

M.V.: De nada. O prazer é meu.

J.C.: Minha relação com o cinema começou na década de 1980, por meio da TV aberta mesmo (minha família demorou a ter um aparelho de VHS). Naquela época as crianças podiam ver de tudo na TV (não estou julgando se era certo ou errado, mas era um fato), desde comédia adolescente sacana, passando por filmes violentos de ação, fantasia, épicos espaciais, aventura até chegar aos filmes de terror sangrento e assustadores (que eram meus favoritos). Tudo isso ajudou a formar a base de minhas referências às quais carrego até hoje.


Outra influência muito forte na minha carreira foram os primeiros filmes que vi no cinema. Fiquei encantado quando (aos 10 anos de idade) me deparei com o filme “Labirinto - A Magia do tempo” de Jim Henson (1986). Foi o primeiro filme que vi na telona e acabou sendo uma experiência inesquecível. Lembro-me de ficar tão impressionado que comecei a ter uma espécie de ilusão com as criaturas do filme, chegando a acreditar que as estava vendo sentadas ao meu lado nas poltronas da sala de cinema durante a projeção (coisa de criança com a imaginação extremamente fértil). Era como se eu tivesse atravessado a barreira da entre sonho e realidade, algo que ainda hoje, busco inserir em meus roteiros.

Já o segundo filme que assisti no cinema foi “Robocop - O Policial do Futuro” de 1987 do diretor Paul Verhoeven. Levei um tremendo choque ao ter contato com toda aquela violência gráfica. De alguma forma, apesar de muito jovem, entendi a proposta do filme e consegui enxergar naquele espetáculo sangrento uma critica ácida e divertida a nossa sociedade da época. Esse uso do fantástico, do grotesco e do absurdo guiando uma história que no seu âmago se propõe a discutir questões mais profundas, de forma muitas vezes irreverente, me agrada muito.

Mais tarde, quando meu pai finalmente comprou um aparelho de VHS, tive acesso a uma grande quantidade de filmes não só na locadora, mas por meio de um parente que tinha uma enorme coleção de filmes. A possibilidade de assistir repetidas vezes os meus títulos favoritos se tornou um prazer que carrego até hoje (me tornei colecionador também, mas de DVD e Blu ray). Foi meu momento de devorar cinema ferozmente, chegando a assistir diversos filmes por dia. Eu me lembro de que ele tinha a trilogia de Star Wars (que eu só tinha assistido na TV), que eu via repetidamente toda a semana, era muito divertido. Foi nessa época também que revi sem parar vários filmes de terror, como Evil Dead (1981), Fome Animal (1992), Hellraiser (1987), A hora do Pesadelo (1984), A volta dos Mortos Vivos (1985), Alien (1979) entre outros mais obscuros que moldaram meu gosto pelo gênero.


Por fim, em 2001, quando ingressei na faculdade, procurei assistir todo tipo de filme possível, criando um repertório que embora tenha base nas obras que vi na infância, foi ampliado consideravelmente, o que com certeza apurou ainda mais meu senso crítico e artístico. Considero tudo o que vejo até hoje como uma referência. O aprendizado é contínuo e constante e cada filme, livro, quadrinho, peça, escultura, pintura ou o que quer que faça parte do meu cotidiano (independente de ser arte ou não), acaba influenciando em minha obra, que por mais que aborde temas absurdos, é calcada na forma com a qual me relaciono com a vida do ponto de vista psicológico e social, muitas vezes extrapolando conceitos para abordar temas da nossa contemporaneidade em forma de entretenimento.

2) Muitos adoram fazer listas de filmes preferidos. Outros julgam que é uma lista fluida. Para não te fazer enumerar vários filmes, nos diga  qual o filme mais importante da sua vida.

J.C.: Essa pergunta é muito difícil responder, pois no decorrer dos anos, várias obras foram importantes para minha formação e elencar apenas uma me parece complexo. Posso citar uma obra por período, assim acho mais justo.

Na época em que eu assistia aos filmes somente pela TV, “Guerra nas estrelas: uma nova esperança” foi uma das obras que mais mexeram com o meu imaginário. A possibilidade de viver aventuras em galáxias distantes, aliado ao romance e toda mitologia era lago encantador para uma criança como eu. Em contrapartida, quando vi Labirinto - A Magia do Tempo no cinema foi mágico. Minha imaginação foi elevada ao extremo! Uma sensação indescritível.


Do ponto de vista de me incentivar a produzir posso citar Matrix, pois além do filme, perdi a conta de quantas vezes assisti ao seu making of no DVD, sempre sonhando em fazer parte de algo como aquilo. Essa é a importância do DVD, o qual, diferente do VHS, já tive acesso desde o início. A possibilidade de ver como foram produzidos os filmes abriu minha cabeça e me fez ver que produzir um filme não era algo tão distante quanto eu pensava.

Se eu levar em consideração questões mais profundas posso citar filmes como 8 1/2 do Fellini ou até Solaris do Tarkovsky, ambos fazem parte do meus filmes favoritos de todos os tempos. São filmes que dialogam com temas sensíveis de uma maneira cinematograficamente linda.

Já no quesito terror, não posso deixar de citar o “A morte do demônio”, filme que mais me influenciou no gênero. Todo aquele improviso, falta de recursos misturados a genialidade dos enquadramentos e movimentos de câmera aliados a uma ótima edição ajudam muito a compreender como podemos criar bons filmes com orçamento limitado (algo que venho sempre tentando em minha carreira). Poderia citar um monte de filmes, e alguns que citei aqui por impulso podem até serem menos importantes do que outros que deixei de fora simplesmente pelo momento em que me encontro escrevendo essas palavras. É difícil citar apenas um, peço desculpas por ser prolixo nesse sentido.


3) Você é  ator, roteirista, editor e apaixonado por cinema de horror. Diretor de filmes independentes, com produções rodando festivais do mundo inteiro e acostumado com a ralação para conseguir financiamentos dos filmes,  qual o conselho deixaria para quem está começando na área? Quais são os erros mais comuns que um diretor iniciante deveria evitar?

J.C.: Meu conselho é sempre o mesmo: Faça. Não espere as condições ideais. Execute seus filmes com os recursos que você possui aproveitando-os ao máximo para que consiga contar a sua história da melhor maneira possível. Estude muito, leia muito, não só sobre cinema, mas todo tipo de conteúdo. Fale de coisas das quais você acredita em seus roteiros e seja extremamente apaixonado pelo que faz, pois não é um caminho fácil e muitas vezes temos que reafirmar o porque de estarmos metidos nisso. Se houver essa possibilidade, trabalhe em filmes ou vídeos de outras pessoas, eu mesmo comecei filmando making-of e ajudando na montagem das luzes no estúdio,  foi a minha escola principal (apesar de ser gradua em Rádio e TV), pois além de prestar atenção nos meus afazeres, nas horas vagas não tirava os olhos do diretor, diretor de fotografia, produtor, atores, maquinistas etc, sempre em busca de aprender um pouco mais a cada dia.

Essa base e primeiro contato com a produção ajudam a compreender como funciona um set de filmagem. Para completar, saiba que estará sempre aprendendo, e por isso, procure sempre avaliar de maneira crítica seus projetos com intuito de identificar os possíveis problemas afim de melhorar os aspectos técnicos e artísticos dos próximos filmes.


4) Algumas profissões rendem histórias interessantes, curiosas e às vezes engraçadas. E certamente, quem trabalha com cinema, tem suas pérolas. Lembra-se de alguma história legal que tenha acontecido  durante a execução de algum trabalho seu e que possa compartilhar conosco? Alguma história de bastidores, por exemplo ...

J.C.: Uma das histórias mais interessantes foi quando trabalhei com o Mestre José Mojica Marins, o interprete do ícone do cinema de horror mundial Zé do Caixão. Em 2015, fui convidado pelo Rodrigo Aragão, grande diretor capixaba de filmes de terror como Mangue Negro (2008), A noite do Chupacabras (2011), Mar Negro (2014) e Mata Negra (2018) para dirigir um dos segmentos do longa-metragem As Fábulas Negras (2015). O meu episódio tratava da lenda da Loira do Banheiro, o qual fiz o roteiro e direção, o que foi muito gratificante.

Um dos diretores convidados foi o Mojica, e o Rodrigo achou por bem que eu deveria trabalhar no seu segmento, O SACI, na função de assistente de direção. É claro que aceitei. Foi uma das maiores honras da minha vida. Eu me senti vivenciando parte da história do cinema participando desse projeto, e é claro que por causa da presença do Mojica como diretor.


Bem, o meu “causo” foi o seguinte. Nós estávamos filmando O SACI em um estúdio. Era uma cena onde o casal religioso conservadores, que eram pais da protagonista, brigam com a filha por ela ter conversado com um feiticeiro na floresta. Depois de filmarmos alguns planos, fizemos uma pausa e o Mojica saiu para tomar um café. Fiquei eu, o Rodrigo e o diretor de Fotografia Marcelo Castanheira debatendo onde seria o próximo plano. Passamos um bom tempo pensando nisso, pois não era algo muito simples.

Depois de muito debate, chegamos a conclusão definitiva de que só poderia ser de um jeito e combinamos de sugerir ao Mojica para ver se ele concordava. Minutos depois, lá vem ele, andando vagarosamente em nossa direção e antes que pudéssemos falar alguma coisa, ele olhou por um segundo em volta do cenário, fez um gesto de enquadramento com as duas mãos apontando exatamente para onde havíamos escolhido e falou: É aqui! Nós nos olhamos embasbacados! O que havíamos debatido por um tempo considerável, ele solucionou quase que instantaneamente. É claro que não falamos nada na hora, mas ali tivemos mais uma vez a certeza de que estávamos na frente de alguém muito especial, que além de ser um excelente artista é muito competente. Foi um aprendizado incrível trabalhar com o mestre, em todos os sentidos.


5) Se pudesse, por um dia, ser um diretor(a) dos (as) mais famosos (as) do cinema, e através deste dia, ver pelos olhos dele (a), uma obra prima sendo realizada, qual seria o diretor (a) e o filme? E claro... Porquê?

J.C.: Stanley Kubrick em 2001: Uma Odisseia no Espaço. Porque sou apaixonado por histórias que se passam no espaço e para mim, essa obra é o ápice desse tipo de filme. Além de apresentar toda uma questão técnica e criativa impecáveis, o longa nos leva a uma viagem que transcende os limites da realidade. O fato de eu escolhê-lo é pela vontade de saber como funcionou o processo de criação para chegar nesse incrível resultado.

6) Agora voltando à sua área de atuação. Qual trabalho realizado você ficou profundamente orgulhoso? E em contrapartida, o que você  mais se arrependeu  de fazer?

J.C.: Eu tenho de verdade muito orgulho de todos os meus trabalhos, mesmo os mais toscos do início de carreira como Minha Esposa é um Zumbi (2006) e Junho Sangrento (20017) serviram para um propósito na época (e por pior que sejam, têm uma galera que adora).


Os que gosto mais são: o curta Gato (2009), Judas (2015) e A Loira do Banheiro (As Fábulas Negras, 2015). Gato foi o primeiro filme que fiz procurando uma estética nova, ainda com o pé no trash, mas desconstruindo alguns conceitos de narrativa e técnica onde tentei colocar uma atmosférica quase onírica, unindo o devaneio ao sadismo, passando pelo realismo fantástico por meio de um ser antropomórfico que influencia (ou não) o protagonista do filme. O Judas é um dos meus filmes mais maduros em relação ao tema, pois trata de exploração do trabalho infantil e maus tratos por meio de uma fábula de horror.

Pude acompanhar diversas exibições do filme (ele já foi exibido em mais de 100 festivais) e o que notei é que há um momento confusão da plateia, que mesmo não concordando com a violência de um determinado personagem se compadece com a sua causa por conta da situação que o levou a cometer os seus atos. Já em A loira do Banheiro pude trabalhar com menos limitação orçamentária, com uma equipe grande e com a vantagem de ter as maquiagens incríveis do Rodrigo Aragão. Não é a toa que tecnicamente, é meu trabalho mais competente. Essas “ferramentas” também me deram a oportunidade de escrever um roteiro mais complexo e denso, pois pude explorar elementos que geralmente em um filme de baixíssimo orçamento eu jamais conseguiria.

7) Agora, para finalizar, deixe uma frase famosa do cinema que te represente.

J.C.:“Rosebud”. Cidadão Kane de Orson Welles.

M.V.: Obrigado amigo. Sucesso para você.

J.C.: Muito obrigado!

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