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WERNER HERZOG VS KLAUS KINSKI - AMIZADE DESTRUTIVA

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Parcerias cinematográficas, na maioria esmagadora, estão ligadas à amizade. De Don Siegal com Clint Eastwood a Martin Scorsese com Robert de Niro. Envolvem diretores com atores, casais, diretores com roteiristas. Mesmo que, em algum ponto, a amizade estremeça, como o caso dos Trapalhões, grupo brasileiro formado por Dedé, Didi, Mussum e Zacarias, que em 1983, chegaram a lançar filmes separados ("O Trapalhão na Arca de Noé" com Didi e "Atrapalhando a Suate" com o trio).

Mas nunca se teve notícia de uma dupla tão explosiva quanto Werner Herzog e Klaus Kinski. Dos 5 filmes que fizeram juntos, 3 estão entre as grandes obras primas do cinema. Uma destas cinco obras se chamou "Meu melhor inimigo". Vamos hoje entender porque esta amizade era tóxica.


Para tanto, precisamos conhecer a personalidade e a história pessoal de cada um, para chegarmos, finalmente, no conflito.

De um lado: Werner Herzog. 

Quem entender a determinação de Brian Sweeney Fitzgerald (Kinski) em Fitzcarraldo entenderá a natureza do próprio Herzog. Seu personagem determinado e destemido é o reflexo da personalidade do diretor. Quem trabalhou com ele em algum dos seus filmes, relatou esta determinação de Werner para conquistar seu objetivo. 

Um dos feitos mais lendários da história do cinema foi justamente neste filme. Buscando autenticidade absoluta em seu drama sobre um homem que moveu um barco sobre uma enorme colina na Amazônia, Herzog e sua produção fizeram a mesma coisa, de verdade. Não houve qualquer trucagem. A imersão de Herzog no personagem foi total. E com ele, a produção teve que embarcar na loucura.


Certa vez, Herzog  prometeu comer seu sapato se Errol Morris concluísse o projeto do filme em cemitérios de animais em que vinha trabalhando, a fim de desafiar e motivar Morris, que Herzog considerava incapaz de dar continuidade aos projetos que concebeu. Em 1978, quando o filme "Portais do Céu" estreou, Herzog cozinhou e comeu publicamente seu sapato, evento posteriormente incorporado a um curta-metragem "Werner Herzog come seu sapato". No evento, Herzog sugeriu que esperava que o ato servisse para encorajar qualquer pessoa que tivesse dificuldade em realizar um projeto.

Um exemplo claro, não só de determinação, mas mostra também que ele é capaz de ultrapassar um limite racional para mostrar seu ponto.


Sua vida é cercada de histórias extremas. Para se tornar um cineasta ele roubou uma câmera de 35 mm do Instituto de Pesquisa de Cinema de Munique. "Para mim, foi realmente uma necessidade. Eu queria fazer filmes e precisava de uma câmera. Eu tinha algum tipo de direito natural a essa ferramenta. Se você precisa de ar para respirar e está trancado em uma sala, você tem que romper a porta ou mesmo a parede.”

Herzog é um grande fã de caminhadas e certa vez caminhou de Munique a Paris.  Sua mentora e crítica de cinema Lotte H. Eisner ficou gravemente doente e ele resolveu fazer uma visita. Com algum dinheiro, um mapa, uma bússola e uma mochila, Herzog fez a viagem em três meses.

Para comprar um livro, trabalhou como um gandula em quadras de tênis por um bom tempo. Ele também é hipnotizador. Ele adorava hipnotizar galinhas. Certa vez, ele queria um desempenho louco do elenco de seu filme, e hipnotizou a todos, menos o ator principal. O filme em questão é Coração de Cristal, de 1976.


Na história, a maior riqueza de um pequeno vilarejo alemão é o tipo de vidro produzido no local, um produto fabricado apenas na cidade. No entanto, quando o único homem que conhecia o segredo para a produção morre, a cidade entra em uma grande depressão e o vendedor dos produtos embarca em uma jornada obsessiva para descobrir o segredo de fabricação dos vidros de rubi.

Em 2006, Herzog foi baleado no abdômen enquanto estava na Skyline Drive em Los Angeles. Ele estava dando uma entrevista sobre "O homem urso" para Mark Kermode, da BBC, quando uma pessoa passou e atirou com um rifle de ar comprimido. Herzog continuou a entrevista, ignorando o fato, afinal, ele estava ali para divulgar o filme e não seria um tiro de ar comprimido que iria pará-lo.


Mais tarde, o atirador revelou ser um fã enlouquecido. Sobre o incidente, Herzog disse mais tarde: "Parece que atraio os clinicamente insanos." Dois dias depois, o destino colocou outro maluco na vida do diretor: Joaquin Phoenix. Numa noite, Phoenix capotou seu carro durante um passeio em Los Angeles, regado a álcool e drogas. “Uma voz alemã disse: 'Apenas relaxe'”, lembra Phoenix, explicando que o diretor apontou que o carro estava vazando gasolina e que Joaquin estava a segundos de se incendiar. Detalhe, quando o diretor chegou, Phoenix estava de cabeça para baixo, entre destroços, airbags, cacos de vidro, mas ele tentava, desesperadamente, acender seu cigarro.

O ator deu entrada na reabilitação depois que o diretor Werner Herzog destacou sua imprudência após um acidente de carro que quase tirou sua vida. Como sabemos, seu irmão River Phoenix faleceu prematuramente, vitimado de uma overdose. Curiosamente, Phoenix veio a interpretar o personagem Coringa, que é o símbolo máximo dos vilões surtados das Hqs. Foi um sucesso gigante e podemos afirmar que sem Werner Herzog, não teríamos o Coringa com Joaquim Phoenix.


O diretor domina a resiliência para superar muitos contratempos. Mas há uma linha tênue entre a determinação e a obsessão.

Do outro lado: Klaus Kinski.

Recrutado durante a Segunda Guerra Mundial aos 17 anos, serviu na Força Aérea Alemã como paraquedista de elite  Ele não viu ação até o inverno de 1944, quando sua unidade foi transferida para a Holanda. Então ele resolveu desertar e o fez conscientemente.

Após o fato, ele foi preso pelos alemães, submetido a corte marcial e condenado à morte, mas ele escapou e se escondeu na floresta. Uma patrulha britânica abriu fogo contra ele, que foi ferido no braço e o levou prisioneiro. Depois de ser tratado por seus ferimentos e interrogado, Kinski foi transferido para um campo de prisioneiros de guerra na Grã-Bretanha. O navio que o transportava foi torpedeado por um submarino alemão, mas ele chegou com segurança. Ele foi mantido no acampamento 186 de prisioneiros de guerra até que a guerra findou em 1945.


Em 1950, Kinski ficou em um hospital psiquiátrico por três dias porque perseguiu sua produtora, por quem tinha uma queda, e acabou tentando estrangula-la. Os registros médicos do período listavam um diagnóstico preliminar de esquizofrenia, mas a conclusão era psicopatia ( transtorno de personalidade antissocial ). Por volta dessa época, Kinski se tornou incapaz de garantir papéis no cinema e, em 1955, tentou suicídio duas vezes.

No ringue, Werner e Klaus

De um lado, um obstinado obsessivo. Do outro, um gênio psicopata. O que poderia dar errado? 

Para realizar 3 obras primas, Kinski e Werner chegaram em seus limites, e tiveram a um passo de rompê-los algumas vezes.  Na produção de Aguirre, os dois estavam sempre a fio. Durante uma noite particularmente turbulenta da produção, Klaus Kinski, irritado com o barulho de uma cabana onde o elenco e a equipe estavam jogando cartas, disparou repetidamente com um rifle Winchester contra ela. Uma das balas arrancou a ponta do dedo de um figurante não identificado. Werner Herzog confiscou imediatamente a arma e continua sendo sua propriedade até hoje.


Em seu comentário, Werner Herzog explicou como ele manipulou Kinski para dar a “performance” que ele queria. Kinski queria expressar a loucura de Aguirre no final do filme com gritos altos. Herzog o fez fazer isso por uma hora e meia, até que Kinski se cansou. Então, ele ficou muito quieto e muito mais contido. O diretor usou a mesma tática em Nosferatu.

Werner Herzog e Klaus Kinski se conheceram muitos anos antes, quando o jovem ator em dificuldades alugou um quarto no apartamento da família de Herzog. As “aprontações” de Kinski durante os três meses em que morou lá deixaram uma impressão duradoura. Anos depois, Herzog sabia que o ator volátil era o único homem possível que poderia interpretar o louco Aguirre, e enviou a Kinski uma cópia do roteiro. "Entre três e quatro da manhã, o telefone tocou", lembra Herzog. “Levei pelo menos alguns minutos para perceber que era Kinski a fonte dessa gritaria inarticulada. E depois de uma hora disso, percebi que ele achou o roteiro fascinante e queria ser Aguirre."


De acordo com Werner Herzog, Klaus Kinski ameaçou abandonar totalmente o filme em um ponto durante as filmagens devido à recusa de Herzog em despedir um assistente de som. Herzog diz que ameaçou matar Kinski e depois apontar a arma para si mesmo se Kinski partisse e mais tarde declarou que estava bastante preparado para isso, sabendo que as autoridades iriam considerá-lo um acidente de caça. Kinski afirmou em entrevistas que Herzog empunhava uma pistola para enfatizar a ameaça.

Werner planejou matá-lo diversas vezes. Em Fitzcarraldo, Klaus Kinski foi uma grande fonte de tensão no set. Ele brigava violentamente com o elenco e se enfurecia por questões triviais. Os nativos ficaram possessos com seu comportamento. Werner Herzog afirmou que um dos chefes se ofereceu, com toda a seriedade, para assassinar Kinski por Herzog.


O diretor também afirmou que uma vez pensou em colocar fogo na casa de Klaus Kinski, porque se sentiu genuinamente ameaçado pelo ator. Felizmente, antes mesmo de ser capaz de fazer isso, ele foi atacado pelo cão pastor de Kinski.

Para finalizar, Pola Kinski (filha de Klaus) relatou que o ator, que morreu em 1991, a sujeitou a 14 anos de abuso sexual e violência desde os cinco ou seis anos. Ela disse que sofreu anos de abuso físico e verbal nas mãos de seu pai, cujo comportamento ela disse ser muitas vezes ameaçador.

Memorável cena de "Meu melhor inimigo", em que Kinski contracena com uma borboleta. Lúdico momento "A bela e a fera" captado ao acaso.

Em uma entrevista, foi perguntado para Werner sobre ter trabalhado com um homem que violou sua própria filha. Sua resposta foi: "- Na época em que trabalhamos juntos, eu não tinha ideia. Mas temos que tirar todas as pinturas de Caravaggio de igrejas e museus porque Caravaggio era um assassino? Temos que descartar o Antigo Testamento porque o profeta Moisés cometeu homicídio culposo quando jovem?"

A vida pessoal deve ser dissociada da artística. De certa forma, foi assim que Werner sobreviveu a Kinski.


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