O QUE É A NOUVELLE VAGUE TAIWANESA
Nouvelle vague taiwanesa
Como sempre digo nos posts sobre conceitos cinematográficos, as manifestações culturais funcionam como um pulso, e os países vão reagindo em cadeia, imprimindo suas próprias características a outras previamente observadas. Começando nos final dos anos 60, com auge nos 70 e declínio a seguir, a maioria delas seguiu este ritmo. As influências eram muitas, como pós-guerra, Woodstock, Vietnã. Mas em Taiwan foi diferente.
Em outubro de 1947, foi fundada a "Taiwan Film Industry Co., Ltd." (Taiwan Film, que nada tem a ver com a posterior Taiwan Film Culture Company). Naquela época, seu principal negócio era operar cinemas e atuar como agência para distribuição de filmes, com o controle de 20 salas de cinema.
Em 1 de setembro de 1954, a Agricultural Education e a Taiwan Photographic Co. Ltd. foram reorganizadas como "Central Motion Picture Corporation”. Taiwan é república da China e a empresa é muitas vezes referida como “China Film Corporation”. A década de 1960 marcou o início da modernização de Taiwan.
Nestes 20 anos, produções chinesas foram feitas pela empresa, até que em 1982 o cinema de Taiwan ganhou vida com filmes locais, dando origem à Nouvelle Vague Taiwanesa. Neste período de 20 anos, o cinema de Taiwan era regido pela censura da China e limitava-se às propagandas chinesas. Algo como de Taiwan fosse república da Alemanha Nazista e fosse sujeita aos caprichos do Führer e Goebbels.
A arte transforma.
Durante 8 anos, a primeira fase da Nouvelle Vague coincidiu com a popularização do VHS, quando assistir filmes em casa "viralizou", tornando algo de primeira necessidade. Mesmo assim, o cinema do local teve dificuldades de competir financeiramente com o cinema de Hong Kong, que tinha grande apelo.
Como contragolpe, a FIlm Corporation deu criou uma iniciativa para apoiar vários diretores novos e jovens. Em 1982, o filme Guang yin de gu shi (1982), apresentou quatro jovens talentosos diretores (Edward Yang, Te-Chen Tao, I-Chen Ko e Yi Chang), deu início ao que seria conhecido como o rejuvenescimento do cinema taiwanês: o Novo cinema taiwanês.
O filme tratava de questões de Taiwan dos anos 50 aos 80, utilizando-se de temas universais em suas pequenas e comoventes histórias como: A família, amizade, relacionamentos, infância, entre outros, para inaugurar um olhar dentro daquele cinema, que estava caminhando para uma identidade própria de onde apareceriam grandes nomes e grandes filmes.
A Nouvelle Vague Taiwanesa puxou mais para a veia "Ozu", com retratos mais reais da vida cotidiana, contrastando com o melodrama ou os filmes de ação de kung-fu. Esses filmes procuraram retratar histórias genuínas de pessoas que viviam em Taiwan, seja na área urbana ou rural, e costumam ser comparados estilisticamente aos filmes do movimento neorrealista italiano.
Essa ênfase no realismo foi reforçada por técnicas narrativas inovadoras. Este cinema investigou questões importantes que a sociedade taiwanesa enfrentava na época, como a urbanização, a luta contra a pobreza e os conflitos com a autoridade política. De forma involuntária, estes filmes criaram um painel sobre a transformação socioeconômica e política de Taiwan nos tempos modernos.
Como todas as Nouvelles Vagues, a "morte" de taiwanesa se deu de forma breve. Mas pelo menos, foi um movimento organizado e coerente. As causas desse rápido declínio são múltiplas. A primeira é que o público, mesmo tendo reservado uma recepção calorosa aos primeiros filmes, logo se cansa desse tipo de obra que mostra a realidade que, muitas vezes, eles querem fugir, e logo se refugiam no entretenimento americano.
Outros elementos importantes que não devem ser subestimados são, por um lado, a falta de cultura cinematográfica na ilha e, por outro, a forte pressão governamental sobre a produção cultural. Diretores e autores devem lutar pelo reconhecimento oficial e para que o cinema seja considerado uma arte em todos os aspectos, e não um produto puramente comercial.
Quanto ao segundo ponto, que é a censura governamental, isso também deve ser considerado no estudo das obras taiwanesas. No final da década de 1980, a situação derreteu consideravelmente, graças à declaração do fim da lei marcial (1987), em vigor há quase quarenta anos. Até então, sob o pretexto da moralidade e da utilidade pública dos filmes e produtos culturais, em geral, o Estado censurava qualquer expressão de descontentamento ou crítica social, por mais velada que fosse.
Em 22 de janeiro de 1987, o Manifesto do cinema taiwanês é publicado. O documento, que trazia a assinatura de todos os principais expoentes da Nouvelle Vague (cineastas, escritores, roteiristas, operadores; entre outros: Hou, Zhu Tianwen, Wu Nianzhen, Christopher Doyle, Huang Chunming, Yang Dechang, Chen Kun-hou), parecia, aos perspicazes olhos ocidentais, um tanto ingênuo, pois não reivindicava revoluções estilísticas (como faz o Dogma 95), mas apresenta alguns conceitos básicos. Resumidamente, era sobre liberdade de expressão e o fim da interferência do governo nos projetos. Os autores também atacaram a mídia que trata o cinema, somente como produto comercial e pedem o reconhecimento artístico.
De 1990 até 2010, formou-se à partir da primeira onda, a segunda.
Nesta fase, os filmes são mais populares e por vezes, menos sérios, embora engajados em retratar a mesma dinâmica social da primeira fase. Estes filmes foram além das barreiras culturais impostas ao longo dos anos, e trataram de temas mais polêmicos. Foi o cinema taiwanês "saindo da casinha", mas esta segunda onda ficou coadjuvante do cinemão hollywoodiano, já que as salas de cinema davam preferência aos sucessos americanos.
Talvez o grande feito desta Nouvelle Vague seja que ela se tornou mais cultuada que a de Hong Kong (que era sua concorrente) e da própria China, que Taiwan era república. E isto, não é pouco.
Veja abaixo 10 filmes para conhecer o movimento.
Filme episódico em que as quatro histórias acontecem cada uma em uma década diferente entre 1950 e 1980 e retratam personagens em diferentes momentos de suas vidas. O filme trata de uma variedade de temas dramáticos, cômicos, econômicos e sociais.
Este drama segue um jovem quando ele muda de uma juventude inteligentemente consciente, para uma adolescência com muito menos confiança do que ele tinha, e, finalmente, para um adulto estável. Ao longo do caminho, sua mãe volta a casar para obter a segurança financeira que ela precisa para sua família e os relacionamentos familiares subsequentes são todos afetados.
Duas amigas que não se viam há treze anos se reúnem. Uma delas é uma pianista de sucesso que acaba de voltar de uma turnê européia e a outra acaba de começar um novo negócio.
Lung, um ex-membro da equipe nacional da liga júnior e agora operador de um negócio de tecido à moda antiga, nunca é capaz de abalar a saudade de sua glória passada. Um dia, ele encontra um ex-companheiro que é agora um motorista de táxi em dificuldades. Os dois falam sobre os velhos tempos e eles são atingidos por um sentimento de perda. Lung está vivendo com seu antigo amor de infância Ah-chin, uma mulher ocidentalizada que cresceu em uma família tradicional. Depois de uma discussão, Ah-chin tenta encontrar consolo por sair com os amigos de sua irmã, um grupo de ocidentais, jovens hedonistas.
Kuei-mei, uma garota pobre do continente, muda-se para Taiwan após a revolução e se casa por conveniência com um viúvo alcoólatra. Apesar de ser rejeitada inicialmente pelos filhos, ela guia a família por décadas de pobreza e traumas até a estabilidade.
Década de 1940. Uma família chinesa sai do continente durante a guerra civil em busca de uma vida melhor em Taiwan. A princípio temporária, a nova moradia acaba se tornando definitiva. Lá o jovem A-ha terá de lidar com o próprio crescimento, a nova sociedade, as mudanças culturais, a morte de entes queridos e o passar do tempo.
Um homem e uma mulher que moram em uma mesma cidade formam uma espécie de par romântico dos sonhos de todos os habitantes da cidade; o único problema é que eles não estão juntos e nem o tempo (ela trabalha de dia, ele trabalha de noite) e nem o destino parecem dar sinais de que eles conseguirão se encontrar.
Uma jovem escapa de um cerco policial. Sentindo-se oprimida e com sua vida destruída, começa a irradiar suas perturbações através de telefonemas anônimos. A partir daí, três histórias paralelas começam a se encaixar. O quebra-cabeças envolve, além da jovem terrorista, uma testemunha que fotografa os acontecimentos e um casal em crise.
Taiwan, 1945. Primeiros anos de República da China. O filme acompanha a derrocada da família do patriarca Lin Ah-lu (Li Tian-lu). Wen-heung (Sung Young Chen), o primogênito, lida com o nascimento de seu primeiro filho enquanto administra o restaurante que é a fonte de renda da família. Wen-leung (Jack Kao), com problemas psicológicos causados pela guerra, logo começa a fazer negócios com a máfia de Xangai. Wen-ching (Tony Leung Chiu Wai), o caçula surdo, é membro atuante da resistência. Um outro irmão nunca mais voltou da guerra nas Filipinas. Em fevereiro de 1947 mais de 20 mil habitantes são mortos numa rebelião e em 1949 a família de Lin encontra-se tragicamente modificada.
Ambientando em Taiwan na década de 1960, o filme acompanha o jovem Xiao Si’r em meio a violentos conflitos entre gangues rivais, formadas por adolescentes. Livremente inspirado em fatos ocorridos durante a juventude do diretor.