QUE HORAS EU TE PEGO? (2023) - FILM REVIEW
Texto: M.V.Pacheco
Revisão: Thais A.F. Melo
Quem poderia supor que um filme de comédia clichê chamado "Que horas eu te pego?" havia tanto a dizer? Tantos elementos interessantes para desconstruir?
No filme, Maddie Barker (Jennifer Lawrence) está lutando para salvar sua casa em Montauk, Nova York. A classe trabalhadora está sendo expulsa pelos ricos do verão. Maddie está muito atrasada em impostos e perde o carro que precisava para o Uber. Ela responde a uma postagem do Craigslist dos Beckers (Laura Benanti, Matthew Broderick).
O filho deles, Percy Becker (Andrew Barth Feldman), é um virgem recluso que irá fundar Princeton. Eles querem que ele transe e ganhe confiança para a vida. Eles contratam Maddie para fazer sexo com ele em troca de um carro usado.
Tramas de incoação sexual de garotos são antigas e se vistas com a evolução da mentalidade geral, são bastante problemáticas. Principalmente se pensarmos na completa objetificação da mulher, que é posicionada apenas para servir. O que não é nada diferente de uma prostituta, que ganha para satisfazer os desejos do cliente.
O que move a personagem Maddie (Jennifer Lawrence) é o desespero, que, de certa forma, é a história de muitos e a principal razão para a busca de tais serviços. Polêmicas ou discussões a parte, a mulher, nesse caso específico, é a comida. Mas ao olhar os dois personagens, lembrei da cabra e do Tiranossauro, em Jurassic Park. Porém, Maddie é o Tiranossauro, não a cabra.
O filme desconstrói de forma impecável esteriótipos. De um lado, o recluso, completamente subordinado aos pais, desprovido da confiança roubada por eles, quer manter o mundo do lado de fora do seu quarto. Do outro, a sem filtro, também subordinada aos pais (muito mais que apenas uma memória afetiva), se aproveita da beleza para manter os homens do lado de dentro, do seu quarto. Duas aparentes antíteses, mas que em foco, se assemelham mais do que poderia supor.
E da relação, nasce a descoberta. Ambos têm acesso aos seus interiores, e se ajudam consideravelmente. E é muito interessante como, de uma aparente relação vazia entre duas pessoas com características opostas, se mostra produtiva para ambos e de quebra, desconstrói clichês do gênero e da vida. Os personagens se mostram com muito mais conteúdo do que o pressuposto.
Ele buscando a autoafirmação. Ela, redenção. E para quem acha que o filme é atrativo por conta da cena de nudez frontal da atriz Jennifer Lawrence, está enganado. A curiosa sequência em que Maddie, totalmente nua, espanca três adolescentes bêbados tentando roubar suas roupas na praia, não é só impagável. Ela tem um fundamento bem distante de apenas ser um chamativo para o filme.
A cena mostra como a impulsividade de Maddie vai além do racional. O filme trabalha muitos pontos integrantes e curiosos, como na sequência em que ela entra na casa onde uma festa acontece, atrás do garoto. Em cada quarto que ela entra, os adolescentes estão ao celular e no final, ela se pergunta se ninguém mais transa nas festas como antes.
Aos poucos, o furacão Maddie vai dando lugar à grande atriz Jennifer Lawrence. A atriz fazia sucesso tanto em filmes "oscarizáveis" como O Lado Bom da Vida, Inverno da Alma e A Trapaça, quanto blockbusters de sucesso como Jogos Vorazes. Ela era boa com público, crítica e premiações.
Após um episódio nada memorável para a atriz em que foi vítima de um vazamento de fotos íntimas na Internet. As fotos da atriz nua foram espalhadas pela web. Após estes eventos, que inclusive coincidiram com alguns poucos filmes medianos da atriz, ela fez uma pequena pausa na atuação e se voltou para formar uma família. Casou-se e em 2022 nasceu o primeiro filme do casal.
E em Que Horas Eu Te Pego?, ao fazer a cena de nudez, ela dá um tapa na cara das possibilidades sobre o assunto, dizendo que está muito bem com seu corpo, e que afinal, todos já viram. A diferença é que ela mostrou por decisão própria e se divertiu muito fazendo.
O filme garante boas risadas ao mostrar dois polos bem conhecidos: a da mulher linda e rodada, em contrapartida, do garoto tímido que os pais temem que ele seja gay. Mas ao fazer isso de forma tão espontânea e sincera, conseguimos ver o óbvio, que a dupla era muito mais do que um simples esteriótipo poderia definir.
No final, sexo não era um elemento tão importante para redefinir rotas. A nudez de Jennifer não era o maior evento do filme. E ainda que o nome sugira um filme bobo, Que Horas Eu Te Pego? É uma comédia de primeira, com uma atriz acima de qualquer suspeita se divertindo horrores.
E sem ressentimentos.