A MALDIÇÃO DE SAMANTHA (1986) - FILM REVIEW
Texto: M.V.Pacheco
Revisão: Thais A.F. Melo
Wes Craven era um exímio criador de franquias de horror, mas nem sempre via suas produções se tornarem uma. Foi assim com Shocker: 100.000 Volts de Terror e este, A Maldição de Samantha, que eram filmes com "cara" de franquia, como "Quadrilha de Sádicos", "A Hora do Pesadelo" e "Pânico".
Na trama de A Maldição de Samantha, Paul é um garoto gênio que acaba de se mudar com sua mãe para uma nova cidade, Paul ganhou uma bolsa de estudos ao conseguir desenvolver um protótipo de inteligência artificial que acabou se tornando um simpático robô chamado BB (No livro era Bee Bee, pois ele se assemelha a uma abelha), que é capaz de aprender por si próprio e se torna companheiro inseparável de Paul.
Mas a maior mudança na vida de Paul vem com a vizinha chamada Samantha (Kristy Swanson, que interpretou a caçadora de vampiros Buffy antes da série em um filme de 1992) e a relação que nasce deste "triângulo". A Maldição de Samantha é a adaptação de um livro chamado “Friend”, de Diana Henstell, publicado um ano antes. Diana faleceu em 2017, aos 80 anos. Ela publicou poucos romances e ficou mais conhecida por conta da adaptação de Craven para os cinemas.
O filme
Apesar do óbvio clima de tensão em vários momentos, prenunciando que uma bomba explodirá, o filme flerta com aquelas comédias oitentistas como Short Circuit: Um Robô em Curto Circuito. E isto é involuntário, fruto da inocência do cinema oitentista. A escalação da atriz Anne Ramsey, que faz uma megera rabugenta mais uma vez (mesma época de papéis similares em Goonies e Jogue a Mamãe do Trem), é um aceno do tom do filme.
Mesmo assim, Craven trata temas sérios e importantes como assédio, intolerância e abuso. Kristy Swanson, 16 anos na época das filmagens. A visão original do diretor Wes Craven e do roteirista Bruce Joel Rubin para o filme foi um thriller de ficção científica sobrenatural com o foco principal na macabra história de amor entre Paul e Samantha, bem como um foco secundário nos adultos ao redor deles e como eles eram os verdadeiros monstros.
Craven filmou esta versão do filme e a Warner Bros. a exibiu para um público teste composto principalmente de fãs de Craven. E a resposta foi negativa, principalmente pela falta de violência e sangue. O estúdio acabou descobrindo involuntariamente a popularidade de Craven como diretor de filmes de terror. O presidente da Warner Bros. na época, Mark Canton, exigiu que Rubin escrevesse seis cenas sangrentas adicionais em seu roteiro. Basta lembrar o sonho de Samantha com o pai, que ao sabermos desta história, soa gratuito.
Craven disse em várias entrevistas que seu objetivo era focar nos vilões do dia a dia e não na trama de vingança. Em suas próprias palavras: "O horror não vem dela, mas das pessoas comuns, que, na verdade, são muito mais assustadoras: por exemplo, um pai que maltrata uma criança é uma figura aterrorizante..."
Enquanto brigava com o estúdio, Wes Craven estava passando por um divórcio complicado, e ele ainda enfrentou um processo de 30 milhões no tribunal com uma pessoa que alegou que Craven roubou a história de A Hora do Pesadelo (1984). Além de tudo isso, ele foi afastado de dois grandes projetos: Os Fantasmas se Divertem (1988) e Superman IV: Em Busca da Paz (1987), ambos também distribuídos pela Warner Bros.
Em uma entrevista à Fangoria, Kristy Swanson disse que ela e os outros atores se viram presos nas tentativas do estúdio tornar o filme mais visceral do que o pretendido originalmente. Durante a produção e as refilmagens, mudanças no roteiro estavam sendo feitas, mudanças no título estavam sendo discutidas (quando Craven iniciou o projeto, ele se chamava 'Amigo', depois foi alterado para 'Inteligência Artificial' e depois para 'IA' antes que os produtores e o estúdio finalmente decidirem por 'Deadly Friend'), e houve muitas discussões sobre o quão violento e sangrento o filme final seria. Todos esses problemas também causaram algumas situações complicadas para o elenco.
De acordo com Wes Craven, o filme teve "sete ou oito" produtores e cada um tinha sua própria ideia de como o filme deveria ser. Curiosamente, como eu citei mais acima, estas mudanças acentuaram a mistura dos gêneros, que antes era mais sutil.
O filme é leve em diversos momentos e pesado em outros. Com isto, muita cena suave ficou na ilha de edição, porque depois das refilmagens forçadas acabou se transformando em um filme completamente diferente.
Além disso, com as adições, o filme ficou mais longo e o estúdio queria torná-lo mais curto para um lançamento nos cinemas mais lucrativo, uma vez que filmes de 90 minutos ou menos teriam mais exibições. Curioso que no início da produção, Wes Craven queria fazer algo semelhante a O Starman (1984), em que Jeff Bridges interpreta um alienígena que, após cair na Terra, se transforma em um humano, se apaixona por uma mulher que o ajuda e, ao longo do filme, reage a certas coisas ao seu redor da mesma forma que a personagem de Kristy Swanson em 'A Maldição de Samantha' depois que ela recebe o microchip implantado em seu cérebro.
De acordo com Swanson em uma entrevista de 1987 com Fangoria: "Craven sugeriu que eu desse uma olhada no filme 'Starman' porque o que ele queria fazer com 'A Maldição de Samantha' era semelhante em tom àquele filme." Interessantemente, John Carpenter dirigiu 'Starman' porque queria fugir de sua reputação de diretor de filmes de terror violentos, assim como Craven queria transformar 'A Maldição de Samantha' para mostrar que ele poderia fazer um filme que não fosse terror de "sangue e tripas". Ambos falharam miseravelmente, ainda que Craven tenha feito ótimos filmes fora da "casinha" como Música do Coração (1999) e Carpenter, Memórias de um Homem Invisível (1992).
O roteirista Bruce Joel Rubin passou por problemas bem semelhantes em Alucinações do Passado, lançado em 1990, sob a direção de Adrian Lyne. Conforme o livro 'Wes Craven: Art of Horror', a versão original de Wes Craven do filme foi "um filme adolescente cheio de charme, sagacidade e atuações sólidas dos simpáticos adolescentes Kristy Swanson e Matthew Labyorteaux (em sua última aparição no cinema, já que se dedicou à TV e fazer dublagens).”
O robô custou mais de 20 mil dólares para ser construído. Wes Craven usou uma empresa chamada Robotics 21. Seus olhos foram construídos a partir de duas lentes de câmera 1950, uma unidade de controle remoto de garagem e uma antena de rádio tirada de um Corvette. O robô poderia realmente levantar 340 quilos.
O mímico profissional Richmond Shepard ensinou a Kristy Swanson todos os movimentos robóticos de sua personagem no filme. Em uma entrevista, Swanson disse sobre aprender a andar dessa maneira específica:
"Fazer esses movimentos foi difícil no início. Você não acha que andar dessa maneira é difícil até que você realmente tente fazê-lo. Mas Richmond era um bom professor e eu peguei a maioria dos movimentos muito rapidamente. "
O resultado é marcante, mesmo com as inúmeras interferências da Warner. E acabou se tornando inesquecível justamente pela cena em que a cabeça da velha rabugenta explode com a bola de basquete lançada por Samantha. Craven fez certo, por linhas tortas.