OS CANHÕES DE SAN SEBASTIAN (1968) - FILM REVIEW
Texto: M.V.Pacheco
Revisão: Thais A.F. Melo
Religião, política,
heresia, hipocrisia...
Em poucas palavras, a história de "Os Canhões de San Sebastian" pode ser definida. Um reflexo do que aparentemente, sempre viveremos do lado de cá das telas. Um religioso tenta esconder um criminoso na Igreja, entendendo que o Estado não pode tocá-lo lá (só Deus poderá julgá-lo). Enquanto isso, o Estado, para ter acesso ao criminoso, retira de cena o padre (redirecionando-o para San Sebastian) a fim de colocar outro padre no lugar e dessa forma, ter acesso (pela permissão de Deus) ao criminoso.
Familiar, não?
Traquinagens políticas para um fim que interesse a uma minoria. O que move a história é a ida de Leon Alastray é um fora-da-lei a quem foi dado o santuário pelo Padre John para à vila de San Sebastian, que encontram desertada, pois seus moradores, covardes, esconderam-se nas colinas para fugir dos índios, que atacam regularmente em busca de suprimentos. Quando o Padre John é assassinado, os moradores de lá pensam que Leon é o homem da igreja. Apesar da negação inicial do fora-da-lei, o que parece ser um milagre acaba "provando" que eles estão corretos. Eventualmente, ele passa a ajudar os moradores, dar-lhes confiança para defenderem-se dos ataques.
Obra divina, livramento, providência...
Henri Verneuil foi um dos mais celebrados diretores do cinema francês, mas muitos não sabem que ele nasceu na Romênia e com o nome de Achod Malakian. Sua família emigrou para a França em 1924, aos quatro anos de idade. Um salto no tempo e 23 anos depois ele convence o ator Fernandel, já então famoso, a participar de um documentário sobre Marselha (cidade natal do ator). Trata-se de Escale au soleil, o primeiro filme do jovem Verneuil.
Em 1949, conseguiu emprego em Paris, como assistente de direção. Um ano depois, estreia no oficio de realizar longas. Em 1991, Verneuil realizou Mayrig, com Omar Sharif e Claudia Cardinale, baseado no romance em que narra a saga de sua família. Lançado em 1985, alguns anos após a morte de sua mãe, o livro foi traduzido em 37 línguas. Em 1992, Verneuil realiza a continuação de Mayrig - "Rua Paraíso", que encerrou a carreira do cineasta. Em 1996, recebeu o César pelo conjunto de sua obra. Hanri Verenuil faleceu em 11 de janeiro de 2002, em uma clínica de Bagnolet, na periferia de Paris, aos 81 anos.
"Os Canhões de San Sebastian" é um dos seus melhores filmes e muito se deve a dupla central, iluminada: Anthony Quinn e Charles Bronson. Curiosamente, o filme é da mesma década de outro com história com pontos similares e com o mesmo ator: Bronson. Vila atacada constantemente, pessoas precisam resolver a situação contando com ajuda de forasteiros. A diferença está no número. Em "Os Canhões de San Sebastian" não são 7 homens e um destino. Mas dois (e um morre logo que chega à cidade). Em tempo, o filme foi rodado no mesmo local da produção de John Sturges.
A aura religiosa permeia o longa.
Logo que Quinn tem o primeiro encontro com Bronson, eles penduram-no em uma árvore, mas na forma de crucificação. E ao acordar, ele olha para o céu, e os galhos das árvores lembram a coroa de Cristo. E como todo filme do diretor, nada é o que parece. Em pouco tempo, descobrimos que o "vilão" Bronson, não é verdadeiramente o vilão (mas se tornará, eventualmente), e sim os índios. Bronson é apenas um líder que governa de forma bruta, intolerante.
Quando ele atira uma flecha numa estátua, e ela sangra, percebemos como as pessoas buscam se enganar, mesmo que Quinn tente mostrar a elas que um cantil com vinho estava pendurado nas costas da estátua, e que aquela cena não foi milagre algum. Cegos, eles veem apenas o que querem ver: que Quinn é um salvador, que chegou, foi crucificado por eles, e "ressuscitou".
A produção:
Ela foi originalmente anunciada em 1964 com Gregory Peck no papel principal, o que acabou não acontecendo. Apesar de ser uma co-produção europeia e da presença de Ennio Morricone, Anthony Quinn e Charles Branson, foi inteiramente filmado no México. Baseado no romance A Wall for San Sebastian de William Barby Faherty, um padre jesuíta. A história ocorre no México de 1700, então governado pela Espanha
Este western difere de quase todos os outros na época em que foi ambientado, o século XVIII. Além disso, sua sonoridade religiosa que vê o milagre como uma ilusão é o oposto da produção americana (onde Deus está sempre ao lado do herói). Curioso o contraponto com a motivação (ou desmotivação) do personagem central, já que ele acaba por usar da religião (ainda que involuntariamente) como meio de prosperidade (expondo a hipocrisia) e com sua liderança, entre em conflito com Bronson, mostrando a necessidade de uma localidade ter apenas um líder, que pensa por todos.
E no final das contas.
Após o duelo de líderes, e a prosperidade (e queda) de San Sebastian, Quinn acaba tendo reconhecimento oficial da Igreja (por lutar por eles como padre) e do Estado (a quem pediu socorro contra os índios) que até então a desprezava. Desta forma, o espetáculo torna Quinn uma figura ímpar: o personagem acabou se tornando um pouco de ambos.
Interessante que sua redenção tenha vindo justamente pela...
religião e a política,
Heresia, hipocrisia...