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COMBOIO DO TERROR (1986) - FILM REVIEW


Caminhões.

Texto: M.V.Pacheco

Revisão: Thais A.F. Melo



Who made who?  who made you?

É um desafio falar apaixonadamente de um filme que você reconhece as deficiências (que são muitas), mesmo assim, continua adorando. Esta "insanidade" tem um nome: Guilty pleasure. O termo é usado para definir aquelas coisas que amamos, mas sentimos uma culpa por gostar. Algo fora dos padrões, mas que de alguma maneira acaba nos conquistando. 

Comboio do terror é um filme que assisti, seguramente, mais de 100 vezes. Conheci o filme entre 1988 e 89, quando gravei-o, com meu saudoso JVC, que me acompanhou por anos na minha formação cinéfila.

Na história, durante a passagem de um cometa pela Terra, uma espécie de rebelião de máquinas contra os humanos toma forma. Os caminhões da cidade começam a se mover por conta própria, parecendo ter o poder de pensar e todos que estão em seu caminho são perseguidos até a morte.


A julgar pela música do grupo AC/DC usada como tema, "Who made who?", o filme faz uma previsão do que seria o mundo tomando pelas máquinas, criadas pelo próprio homem. Algo mostrado anteriormente em Exterminador do Futuro. Dois anos antes, para ser preciso. O roteiro foi vagamente baseado no conto, escrito por Stephen King, intitulado no Brasil de "Caminhões" (Trucks) do livro Sombras da Noite (Night Shift) de 1978. 

Naquele período eu não fazia ideia de quem era Stephen King e nem imaginava que me tornaria um assíduo maratonista das suas adaptações para o cinema ou TV.  Aliás, este foi o único filme dirigido por King. A obra teve uma refilmagem para a TV em 1998, chamada “Trucks - Comboio do Terror”.

Quem criou quem, quem criou você?
Quem criou você?
ninguém te contou?
Quem criou quem, quem criou você?
Se você os criou e eles criaram você
Quem pagou a conta e quem criou quem?
Quem criou você?
Quem girou o parafuso?
AC/DC


O filme reflete uma época de limitações artísticas. O principal nome do elenco é Emilio Estevez, que além de ser filho de Martin Sheen, era popular em filmes juvenis, como Freejack e Jovem demais para morrer.

Stephen King, sendo um ex-viciado em cocaína, mais tarde admitiu que estava "enlouquecido" o tempo todo em que estava dirigindo o filme e muitas vezes não sabia o que estava fazendo. Ele comentou que gostaria de tentar dirigir novamente algum dia, desta vez, sóbrio.


Comboio

A parada de caminhões "Dixie Boy" era um conjunto construído a 16 quilômetros de Wilmington, na Carolina do Norte. Foi convincente o suficiente a ponto de que vários caminhoneiros tentaram parar e, eventualmente, os produtores tiveram que colocar anúncios em jornais locais dizendo que o "Dixie Boy" era apenas um cenário de filme. Alguns caminhões usados ​​no filme eram de empresas locais e os nomes reais das empresas permaneceram nos veículos.

O AC / DC foi selecionado para fazer a música do filme já que Stephen King é um grande fã do grupo, e quando os conheceu, perguntou se eles fariam uma música para este filme. Ele também ofereceu à banda um papel no filme, mas se recusaram, afirmando que não tinham esta vocação. Stephen King originalmente queria colocar Bruce Springsteen como ator principal.


Enquanto filmava a cena em que o rolo compressor atravessa o campo de beisebol, King solicitou que o departamento SFX colocasse uma bolsa de sangue falso perto do boneco de um jovem jogador que seria atropelado por ele. O efeito desejado seria que uma mancha de sangue aparecesse no rolo compressor e fosse manchada na grama repetidamente, como uma prensa de impressão. 

Dirigindo a sequência, no entanto, a bolsa de sangue explodiu muito cedo e pulverizou por toda parte, fazendo parecer que a cabeça do garoto também havia explodido. King ficou emocionado com os resultados, mas os censores exigiram que o take fosse cortado.


Um acidente ocorreu em 31 de julho de 1985 durante a cena do cortador de grama controlado por rádio usado em uma cena. Ele ficou fora de controle e atingiu um bloco de madeira usado como suporte de câmera, disparando lascas de madeira que feriram o diretor de fotografia Armando Nannuzzi. Como resultado: ele perdeu o olho direito. Nannuzzi processou Stephen King (e equipe) em 18 de fevereiro de 1987. O processo foi resolvido fora do tribunal.

Se você quer que seja feito da maneira certa, você deve fazer isso sozinho.
Stephen King


A frase acima parece arrogante, mas se pensarmos que o diretor é próprio autor da obra em que o filme se baseia, não é tão absurda. Embora, ao longo dos anos, King dissesse que esta é uma das piores adaptações de uma obra sua. Considerando que ele quem dirigiu, podemos afirmar que o diretor estava mesmo drogado...


Kingverso da loucura

No filme, os personagens falam sobre ir a uma ilha chamada Haven, onde não haveria carros. Anos mais tarde, Haven seria uma série, também baseada num trabalho de King chamado "The Colorado Kid", publicado em 2005. Ao longo dos anos, King tornou bem o comum esta ideia de que várias de suas obras são canônicas. Na série, uma agente do FBI (Audrey Parker) chega à pequena cidade de Haven, em Maine, para um caso de rotina. 

Habilidades adormecidas da cidade começam a se expressar e Audrey ajuda a manter essas forças à distância enquanto descobre os segredos da cidade.  No episódio da segunda temporada, chamado "Love Machine", carros e barcos são vistos ganhando vida e atacando seres humanos da mesma forma que fizeram neste filme.


No filme, a Terra passa pela cauda do cometa em 19 de junho de 1987. Em 19 de junho de 1999, King seria atingido e quase morto por um motorista de caminhão distraído. O número 19 tem sido proeminente em seus escritos durante a maior parte de sua carreira.

A produção foi cercada de rumores de que George A. Romero dirigiu o filme enquanto King procurava tratamento para seu vício em cocaína. Muitos fãs do trabalho de Romero notaram que "Comboio do terror" apresenta alguns de seus diferentes ângulos de câmera e opções de edição. Embora King nunca tenha admitido isso de antemão, ele mencionou que Romero estava constantemente no set e King costumava pedir conselhos sobre direção.

Não importa se o filme foi dirigido por um ou por outro. O que interessa é o resultado. E nele, residem críticas e mais críticas que você pode encontrar facilmente na internet. E o pior, que elas têm sempre razão. O funciona não funciona em nenhum nível. Como comédia, filme de terror ou ação. As inconsistências são confusas para detalhar, até para explicar, como, por exemplo, por que os veículos usados ​​pelos personagens parecem ser de alguma forma imunes, mesmo quando todas as outras máquinas parecem decididas a destruí-los?

As máquinas às vezes parecem entender inglês, outras vezes não. Elas falam em código Morse com os humanos em uma cena, e em outras parecem estar ligadas telepaticamente umas às outras. E os diálogos? Meu Deus!  Em certo momento, uma personagem manda esta: "Vou te dizer uma coisa... você com certeza faz amor como um herói".

E o filme ainda busca apoio filosófico para diálogos como:"Talvez amanhã, seja nosso mundo novamente". Enquanto outro responde:"Eu não sei... ele já foi?" Comboio do terror é um filme fácil de odiar.  

Mas sigo o caminho inverso. Das atuações péssimas às justificativas que não se justificam, é um dos filmes que me fizeram amar cinema e a descobrir que "há vida lá fora". Ele foi minha porta de entrada para o mundo da Sétima Arte que vivo até hoje. 

Você pode argumentar que é uma porta enferrujada, desgastada e feia. Mas eu ressalto a importância dela existir e me estimular a passar por ela. Como diria a narração da famosa série dos anos 60: "Há uma quinta dimensão além daquelas conhecidas pelo Homem. É uma dimensão tão vasta quanto o espaço e tão desprovida de tempo quanto o infinito. É o espaço intermediário entre a luz e a sombra, entre a ciência e a superstição; e se encontra entre o abismo dos temores do Homem e o cume dos seus conhecimentos. É a dimensão da fantasia. Uma região Além da Imaginação."

E Comboio do terror foi a porta que me levou para lá.

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