SONÂMBULOS (1992) - FILM REVIEW
Texto: M.V.Pacheco
Revisão: Thais A.F. Melo
Você já assistiu a um filme o qual se sentiu culpado por gostar? Esse é um sentimento completamente absurdo, mas comum na vida de qualquer pessoa que aprecia um "bom" filme. É tão comum que possuí nome: Guilty Pleasure, que por definição é um filme que você se sente culpado por gostar, já que percebe que tal produção é vista socialmente questionável.
E sentir vergonha ou constrangimento por gostar de uma produção é um verdadeiro atentado contra seu próprio eu. A necessidade de ser socialmente aceito, despersonaliza o indivíduo a ponto de omitir seu próprio prazer em prol do que os outros vão pensar.
Afinal, em um grupo de cinema, você prefere enaltecer os filmes do Ingmar Bergman ou dizer que viu 50 vezes Lua de Cristal ou Super Xuxa Contra o Baixo Astral? Você se assume que é fã de filmes de heróis ou se sente culpado (a) devido à opinião de grandes diretores do cinema, que opinam de forma contrária?
Sonâmbulos é uma adaptação de uma obra do mestre Stephen King que se enquadra perfeitamente nessa definição, já que é estranho, impopular entre os fãs do autor e odiado por críticos, mas eu assisti por volta das 80 vezes.
Na história conhecemos Charles Brady (Brian Krause) e sua mãe, Mary (Alice Krige), os últimos sobreviventes de uma espécie em extinção de vampiros: os Sonâmbulos. Para se manterem vivos, eles devem se alimentar da energia vital de humanos inocentes. Planejando sua próxima vítima, a dupla viaja até uma cidade pacata em busca de uma mulher virgem para saciar sua fome, até que encontram o alvo ideal: a estudante Tanya Robertson (Mädchen Amick).
Do you love me?
Para ter uma vaga ideia de quanto eu gostava de rever o filme, eu gravei a música da cantora Enya chamada "Boadicea" (que toca logo no início, enquanto mãe e filho dançam) com um gravador, daqueles disponíveis nos anos 90, em que você gravava o som ambiente. Portanto, eu gravei e escutei centenas de vezes, a música e aqueles diálogos específicos. E logo depois, a música que Tanya escuta no cinema, "Do you love me?".
Em uma das minhas conversas com o diretor Mick Garris, ele me disse que a música foi escolhida porque, dentre as opções disponíveis, era a que melhor se enquadrava. Portanto, não foi uma escolha prévia, portanto uma verdadeira obra do destino.
Curioso que tanto Mick quanto Mädchen Amick (Tanya) são alérgicos a gatos. Amick inclusive omitiu isso no processo de produção, para não afetar sua escolha para o papel.
Rupert Wainwright foi originalmente contratado para dirigir, mas deixou o filme e foi substituído por Mick Garris, que se reuniu com o estúdio, mas foi preterido em favor de Wainwright. De acordo com Garris, Wainwright fez alterações no roteiro que tanto o estúdio e Stephen King (que tinha a aprovação do diretor) não gostaram.
King aprovou Garris como diretor por gostar de Psicose 4: A Revelação (1990). Teve assim início uma parceria que rendeu ótimos frutos: Dança da Morte (1994), Maldição de Quicksilver (1997), O Iluminado (1997), Montado na Bala (2004), Desespero (2006), e Saco de Ossos (2011), além do próprio Sonâmbulos, lançado em 1992.
Garris revelou que a esposa de Stephen King, Tabitha King, escreveu um esboço para uma sequência que envolveria um time de basquete feminino, mas que nunca viu a luz do dia, como sabemos.
Get the bad guy, Get the bad guy.
Sonâmbulos é bem mais próximo da realidade que se supõe. Na cena de sexo entre Charles (Brian Krause) e Mary (Alice Krige), entendemos que ele suga de Tanya a força vital (tem que ser uma mulher virgem) e alimenta sexualmente sua mãe. Isso ocorre, de forma sensivelmente diferente, ao nosso redor, com pessoas que são verdadeiras vampiras, que sugam nossas energias.
Curioso que a outra cena entre os dois foi a mais complicada. Mick Garris revelou que eles tiveram que fazer nove cortes diferentes para obter uma classificação R. "Há uma cena que deveria ser uma tomada única onde começa no espelho e depois desce para ver as roupas no chão. A câmera se move para cima para ver pés descalços, pernas nuas, corpos nus e, em seguida, revela o espelho atrás deles enquanto estão fazendo sexo na forma de criaturas. Mas as nádegas de Brian deram uma classificação X. Garris então alterou para a forma que vemos no filme.
Participações especiais
E como se não bastasse, o filme é um desfile de grandes nomes, principalmente diretores que aprendemos a amar, mas não conhecíamos na época os rostos, pois não havia tanta divulgação dos realizadores além do nome. O filme já começa com Mark Hamill, o eterno Luke Skywalker na saga de ficção científica Star Wars, como um dos policiais que entra na casa cheia de gatos mortos.
Vemos depois Joe Dante (diretor de Gremlins) como um assistente na delegacia, John Landis, que realizou a obra-prima "Um Lobisomem Americano em Londres" como um técnico de laboratório, Tobe Hooper (de O massacre da Serra Elétrica e Poltergeist) como um Técnico forense e o próprio rei, Stephen King, como o zelador do cemitério; além de Clive Barker (de Hellraiser) como o técnico forense. Este é o único filme da história que podemos ver Stephen King e Clive Barker na mesma cena. Aliás, é impressionante como o cemitério se assemelha ao que vimos em Cemitério Maldito, de 1989, que adapta outra obra de King.
Esta foi a primeira adaptação de Stephen King que Ron Perlman (Hellboy). O segunte foi Desespero (2006) 14 anos depois, dirigido pelo próprio Mick Garris. Interessante notar que tanto Alice Krige quanto Perlman interpretaram vilões da saga Star Trek. Krige foi a Rainha Borg em Jornada nas Estrelas: Primeiro Contato (1996), e Perlman, Reman Viceroy em Jornada Nas Estrelas: Nêmesis (2002).
E para finalizar, Lyman Ward e Cindy Pickett, que interpretaram os pais de Tanya, também eram casados na realidade na época das filmagens. (Eles se conheceram quando atuaram em "Curtindo a Vida Adoidado", onde também interpretaram um casal). Detalhe: eles se separaram em 1992, ano de lançamento do filme. Acredito que os vampiros do filme sugaram a energia do casal.
Em tempo, a belíssima trilha original foi composta por Nicholas Pike. E após alguns anos de sofrimento, escutando minha péssima gravação, comprei a trilha lançado em CD pela produtora Milan.
E tenho até hoje.
O Cd e a gravação sofrível.
E é essa paixão que move os aficionados por cinema. E não há nada em que se envergonhar disso.
It's just you and me Clovis. It's just you and me.