CEMITÉRIO MALDITO (2019) - FILM REVIEW
Texto: M.V.Pacheco
Revisão: Thais A.F. Melo
A diretora Kimberly Peirce (Meninos Não Choram), teve problemas em transpor sua visão do livro Carrie - A estranha, em 2013, porque os produtores queriam um remake do clássico de Brian de Palma.
O mesmo não acontece com Cemitério Maldito, ainda que a trama seja essencialmente a mesma, mostrando a família Creed se mudando para uma nova casa no interior, localizada nos arredores de um antigo cemitério amaldiçoado usado para enterrar animais de estimação - mas que já foi utilizado para sepultamento de indígenas. Algumas coisas estranhas começam a acontecer, transformando a vida cotidiana dos moradores em um pesadelo.
A direção é de Kevin Kölsch e Dennis Widmyer, que não fizeram nada de relevante no cinema (nem antes ou após). Mas aqui, acertaram a mão fugindo do clássico de 1989 em vários momentos, inclusive nos proporcionando um final bem mais interessante. E até mesmo o elenco, como Jason Clarke e John Lithgow (nos papéis que anteriormente foram de Dale Midkiff e Fred Gwynne) são mais competentes.
A ambientação do cemitério e a interação de Creed com o rapaz morto-vivo também são muito melhores. Outro ponto forte do filme é agregar camadas aos personagens, colocado-os emocionalmente instáveis devido a traumas, corroborando com as atitudes que eles tomarão.
Enquanto isso, em um site qualquer...
"Sempre famintos, eles ansiavam por carne humana, que é a única substância que poderia sustentá-los", escreveu o contador de histórias Ojibwe Basil Johnston em The Manitous. A ironia é que, tendo comido carne humana, os Wendigos "cresceram em tamanho", então sua fome e desejo permaneceram proporcionais; portanto, eles estavam eternamente famintos. Eventualmente, após vagar pelas florestas do Canadá e Minnesota, o sempre faminto Wendigo abriu caminho para Ludlow.
Jud, vizinho de Louis, lança alguma luz sobre a história do Wendigo e Ludlow. Residente em Ludlow desde sempre, Jud sabe muito bem que não deve se aventurar no cemitério com muita frequência. A julgar pelos arquivos que Louis abre em seu computador, os poderes do cemitério parecem ser de conhecimento comum em Ludlow.
King ama gatos.
Basta lembrar de Olhos de Gato, Sonâmbulos e até em Cemitério Maldito: o animal escolhido para ser trazido de volta a vida é um gato. Quando Creed procura sobre o cemitério na internet, ele vê uma foto de pessoas mascaradas em uma espécie de ritual. E a primeira, está com uma máscara de gato. E muito parecida com os sonâmbulos do filme homônimo.
King sempre trata do fanatismo religioso em seus livros, e achei bastante interessante que o nome do gato seja Church (Igreja) e que ele traga maldição para a casa dos Creed. Foi um paralelo perspicaz, ainda que Ellie tenha dado outra versão da origem do nome de seu gato para Jud: diminutivo de Winston Churchill.
A treinadora de animais Melissa Millett revelou que um total de cinco gatos foram escalados para interpretar Church, embora um deles tenha desistido após ficar com medo no set. Os atores felinos foram acomodados em cinco trailers, com seus treinadores humanos, embora um tenha que ser mantido em um trailer separado dos demais porque não se dava bem com seus colegas de elenco.
Millett observou: "O único gato que trabalha bem é um gato feliz... Eles eram muito mimados". A equipe de filmagem até construiu uma área perto dos trailers, apelidada de "catio", onde os gatinhos trabalhadores podiam brincar e relaxar entre as tomadas. Os gatos passaram dois meses treinando para as filmagens, que duraram cerca de 10 semanas.
O quinteto de estrelas felinas encontrou lares após o término das filmagens: dois foram adotados pelo coordenador de animais do filme. Millett encontrou lares para outros dois com amigos e manteve um para si mesma.
Curiosamente, o gato Leo, que estampa o pôster, faleceu em 30 de maio de 2019, ano do lançamento do filme. O treinador Kirk Jarrett foi um dos que adotaram um gato logo depois do encerramento das filmagens.
Dos quatro gatos da raça Maine Coon usados para interpretar Church no filme (o quinto era de mal com a vida), Tonic e Leo foram os principais gatos usados, com o primeiro interpretando a versão viva do personagem, enquanto o segundo foi usado como morto-vivo, após sua ressurreição.
O cemitério de King
No livro, King faz referência específica à tribo Micmac como a explicação de Jud sobre as origens do lugar. Widmyer e Kevin Kölsch escolheram uma explicação mais culturalmente sensível, que os indígenas também encontraram o terreno, mas fugiram após descobrir seu poder.
"Não se trata apenas de sensibilidades modernas, mas achamos interessante se este é um daqueles lugares onde algo sobrenatural acontece que não pode ser explicado", disse Kevin Kölsch. "Você pensa em todos esses lugares, como o Ponto Misterioso, Stonehenge e a Ilha de Páscoa - é a maneira como pensamos sobre muitas histórias ou religiões, que essas são as maneiras pelas quais as pessoas explicam os fenômenos." "Ou lidam." acrescentou Widmyer.
Todas as mudanças em relação ao romance foram impulsionadas pelo desejo de encontrar um novo ângulo para a história familiar. "Quando você está fazendo uma adaptação, você quer fazer o máximo possível de coisas novas porque já existe um filme existente", disse Kevin Kölsch. "Mas, ao mesmo tempo, você quer ter certeza de que está se mantendo fiel à essência do livro, para que as pessoas ainda sintam que estão se envolvendo com a obra de Stephen King."
De acordo com Kevin Kölsch , a mudança da cena da morte de Zelda foi baseada em uma notícia que Widmyer leu na qual uma garçonete caiu em um elevador e quebrou o pescoço durante sua primeira semana de trabalho. "A ideia de morrer dessa forma foi tão horrível para mim que dissemos, quer saber, e se tentássemos fazer mais com isso." disse Widmyer. "Ainda me arrepia quando penso nisso."
Muitiverso Kinginiano
Durante a festa de aniversário de Ellie, Jud pode ser ouvido ao fundo dizendo: "Havia um grande São Bernardo ... matou quatro pessoas", situando a história de Cujo (1983) no mesmo universo.
Quando Rachel está voltando para casa de Boston, há uma placa na estrada que diz "Derry 20 milhas (32,19 km)". Ou seja, se ela for para lá, pode ser que encontre certo palhaço atormentando crianças, já que conhecemos a cidade de "IT".
A cidade de Ludlow fica cerca de uma hora de carro de Castle Rock, cenário de algumas histórias como A Hora da Zona Morta, Cujo, Metade Negra e Trocas Macabras.
Antes de começar seu novo emprego, Louis menciona que sua ocupação anterior era trabalhar no "Turno do Cemitério", no pronto-socorro, mesmo local visto em Criatura do Cemitério (1990).
Quando Gage diz repetidamente, "Pascow" é muito semelhante a como Danny Torrance diz "Redrum" em O Iluminado (1980).
Há outras referências sutis a O Iluminado. O exemplo mais notável é quando Ellie está tentando invadir o banheiro para matar Rachel, da mesma maneira que Jack Torrance. Ellie está batendo contra a porta enquanto Rachel agarra Gage e o ajuda a sair pela janela pela qual ela não consegue passar, semelhante a Wendy Torrance.
Há também uma cena no filme O Iluminado original, em que Danny aponta uma faca para sua mãe enquanto ela dorme, como Ellie faz neste filme (embora em O Iluminado, Danny não tenha tentado esfaqueá-la).
Ellie é atingida pelo trailer de combustível, como Johnny em A Hora da Zona Morta (1983), exceto que ele entrou em coma, e ela...
Maldito
Stephen King certa vez descreveu suas obras como “o equivalente literário de um Big Mac” – nada extravagante, mas atende às necessidades do público. E Cemitério Maldito consegue em atingir o mesmo objetivo: não ofende os fãs do clássico, mas se atualiza, buscando novas alternativas e consequentemente, novos fãs.
E se isso não o define como um ótimo remake, não sei o que definiria...