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O ALBERGUE - SAGA REVIEW

 

O albergue.

Texto: M.V.Pacheco

Revisão: Thais A.F. Melo


O estranho fascínio pelo mórbido

Desde sempre, o ser humano se atraí pela morbidez. O sucesso dos filmes como o Albergue e a popularidade do "True crime" impressionam menos do que deveria. A popularidade dos programas e noticiários em que a violência prevalece, caracteriza nossa estranha fascinação pela morbidez. Há um ditado popular francês que diz "as más notícias chegam depressa", reforçando a ideia de que a morbidez tem algo de "especial" que aguça a curiosidade e nos faz compartilhá-la com maior interesse.

🔷O Albergue  (2005)

No filme, Paxton (Jay Hernandez) e Josh (Derek Richardson) são dois mochileiros universitários americanos, que decidem viajar pela Europa em busca de experiências que entorpeçam os sentidos e a memória. Durante a viagem, eles conhecem Oli (Eythor Gudjonsson), um islandês que passa a acompanhá-los. 

Seduzidos pelos relatos de outro viajante, eles decidem ir a um albergue particular em uma cidade desconhecida da Eslováquia que é descrito como um verdadeiro nirvana. Lá, eles conhecem Natalya (Barbara Nadeljakova) e Svetlana (Jana Kaderabkova), duas beldades locais que se interessam por Paxton e Josh. Empolgados com as experiências novas que vivem, eles logo descobrem que nem tudo na cidade é a maravilha aparente.

Nas entrelinhas

Eli Roth escreveu o personagem Oli especialmente para Eythor Gudjonsson. O diretor conheceu o ator em meio à divulgação de Cabana do Inferno na Islândia. Embora Gudjonsson fosse um empresário local e ex-atleta sem experiência em atuação, Roth ficou tão impressionado com seu carisma e charme que prometeu que um dia o colocaria em um filme. Gudjonsson ficou surpreso ao ver que Roth havia cumprido sua promessa e aceitou o papel com alegria. Além de alguns anúncios de TV, este continua sendo o único papel de Gudjonsson como ator.

Anos depois, Roth pediu perdão oficial ao presidente da Islândia, por ter feito com que os islandeses parecessem maníacos por sexo e drogados através do personagem Oli. Ao saber do pedido, o presidente riu e concedeu o perdão, dizendo que aquele era um lado pouco visto dos islandeses em filmes. O diretor também pediu perdão ao Ministério da Cultura da Islândia, por quaisquer danos que O Albergue possa ter causado à reputação do país.

O interior do matadouro foi filmado num hospital psiquiátrico em funcionamento em Praga, construído em 1910, numa ala que estava fechada há mais de 50 anos. O Prédio 10, onde muitas das cenas foram filmadas, era para onde eram levados os pacientes mais insanos. O porão era tão assustador que Eli Roth tinha um quarteto de cordas tocando música clássica para deixar o local mais aconchegante durante as filmagens.

E por fim, e mais importante, o quarto que o trio aluga é o 237, uma referência a O Iluminado (1980), de Kubrick e adaptação do mestre do horror Stephen King.

Estrelando: Eli Roth e grande elenco

Além de Eythor Gudjonsson, que de ator, só mesmo o lado empresário, o diretor Eli Roth contratou verdadeiros meninos de rua para interpretar os integrantes da Bubble Gum Gang (a Gangue do Chiclete). Já o ator que interpreta o motorista de táxi na cena em que os viajantes entram em Bratislava pela primeira vez, estava tão bêbado na manhã das filmagens que a equipe o substituiu por um dublê sóbrio.

Jan Vlasák (O empresário holandês) não falava uma palavra em inglês; ele aprendeu suas falas foneticamente. Embora Kana seja japonesa, ela é interpretada pela atriz cingapuriana Jennifer Lim. Semelhante a Jan Vlasák, Lim não falava japonês. Por volta dos 9 minutos, Quentin Tarantino aparece como um alemão sem camisa gritando de uma janela.

Quando Paxton, Josh e Oli chegam ao albergue eslovaco, os funcionários estão assistindo a um filme na TV. Este filme é Pulp Fiction - Tempo de Violência (1994) (Tarantino foi produtor de "O Albergue"). E o filme pornô que o guarda da fábrica assiste no DVD player é Febre Sexual (2003), a paródia pornográfica do primeiro filme de Roth, Cabana do Inferno (2002).

Gore

Traduzindo do inglês, gore é um termo usado de várias maneiras, entre elas, para indicar “sangue coagulado”. O termo gore (também conhecido como Splatter) é constantemente associado ao terror por razões bem simples, já que o uso de violência gráfica com o intuito de provocar no espectador sentimentos de repulsa e espanto não é recente. 

Entretanto, nos últimos anos houve um grande aumento na procura por esta violência tão extrema que permitiu a existência de filmes como O Albergue, A Centopeia Humana, Fome Animal e Náusea Total (ambos os primeiros longas do renomado Peter Jackson), além de um longo grupo de estranhos e doentios títulos japoneses como Grotesque ou Tokyo Gore Police. Estaríamos ficando mais sádicos? 

Ou então a liberdade para que produções deste nível se tornem mais acessíveis e permitidas acabou nos insensibilizando a ponto de que sejamos atraídos e fiquemos cada vez mais indiferentes aos horrores do sofrimento alheio? Ou ainda sofremos uma regressão moral com a flexibilidade das censuras?

Ou é apenas, curiosidade mórbida?

🔷Albergue 2 (2007)

Dando continuidade à introdução "O estranho facínio pelo mórbido", Albergue 2 vem para reforçar a ideia. O filme recuperou o triplo de seu orçamento em seu lançamento nos cinemas. Juntos, ambos "Albergue", custaram um total de 15 milhões de dólares e arrecadaram um total de 115 milhões de dólares nos cinemas em todo o mundo, tornando-a uma das franquias de terror mais lucrativas.

Afinal, porque o sangue, as lágrimas e o medo repelem e seduzem em igual medida? É historicamente comprovado que a violência, o sofrimento e a morte são apreciados pela humanidade desde há muito tempo. Na antiga Roma, os famosos coliseus atraíam centenas e até milhares de espectadores para assistirem escravos lutarem contra animais famintos e se dilaceraram uns contra os outros; cristãos eram executados publicamente. E não pense que isto seja um pensamento momentâneo: durante a Revolução Francesa, os inimigos foram decapitados como verdadeiras atrações populares.  

A literatura e o cinema, por fim, podem até ser considerados modos mais saudáveis de atender a sede e a fome humanas por sangue e tripas, um sentimento reprimido por valores morais, mas ainda atuante através do instinto de autopreservação e do medo de agressões ao próprio corpo. 

O gore, before...

Durante os anos 1970, a violência gráfica começava a se tornar mais intensa até chegar aos anos 1980, onde houve um aumento da confiança para se iniciar uma total exploração do repulsivo e macabro nos filmes. Ainda não abordando os filmes trash, vários títulos surgiram e se tornaram famosos por entrarem de cabeça nesta onda, como Kubrick em O Iluminado (referenciado no primeiro Albergue) e George A. Romero, um pouco antes, com O Despertar dos Mortos. 

A menção a Romero é muito importante, pois O Despertar dos Mortos pode ser considerado o primeiro gore verdadeiro, mas, mesmo com produções louváveis como A Morte do Demônio, a consolidação do que seria gore surgiu na Inglaterra com Clive Barker. Repulsivo e horripilante até mesmo atualmente, Hellraiser é de se esfriar o sangue com sua incrível maquiagem e seu nenhum receio em representar ferimentos e deformações bizarras com um toque de “carne viva”. Mas fora um ou outro sucesso, o gore não era propriamente popular.

A continuidade desta história nos leva, evidentemente, a Albergue 2. 

Na trama, Beth (Lauren German), Lorna (Heather Matarazzo) e Whitney (Bijou Phillips) são jovens americanas em viagem a Roma. Ao fazer um passeio de final de semana, elas são atraídas por uma bela modelo, que conhecem no caminho para uma região remota da Eslováquia. A modelo lhes oferece que conheçam um spa exótico, onde poderiam relaxar, rejuvenescer e se divertir. Elas aceitam o convite, sem imaginar que serão vítimas de um leilão em que participam pessoas ricas e doentes de diversos países.

Nas entrelinhas

Edwige Fenech deixou a aposentadoria como atriz para participar deste filme. O diretor Eli Roth a encontrou durante a turnê promocional de O Albergue e, por ser seu fã, perguntou se ela consideraria a possibilidade de voltar a atuar. Fenech, que hoje é uma produtora e distribuidora de sucesso na Itália, respondeu que apenas retornaria se fosse para trabalhar com ele.

Luc Merenda também saiu da aposentadoria para interpretar O Detetive. Eli Roth é um grande fã dos filmes italianos dos anos 1970, como Torso (1973), Edera (1992). Ruggero Deodato, diretor de Canibal Holocausto (1980), faz uma pequena participação no filme, como um canibal.

Para as cenas no bordel que Stuart e Todd visitam, Eli Roth fez questão de filmar em um bordel genuíno em Praga. Era famoso por oferecer aos clientes sexo gratuito com as prostitutas, o que normalmente incluía felação e sexo vaginal, além de beijos e passar a língua no corpo das mulheres (inclusive nos seios), desde que os homens usassem camisinha e concordassem em transmitir ao vivo pela Internet suas atividades, que eram visualizadas por assinantes pagantes. O bordel fechou em 2010 e o site não está mais ativo.

Realidade e ficção se misturando...

A Sra. Bathory (Monika Malácová) que se banha em sangue virgem é baseada em uma mulher real. Elizabeth Báthory, também conhecida como a "Condessa de Sangue", foi uma nobre húngara que viveu de 1560 a 1614. Ela é famosa por seus supostos crimes, que incluem torturar e matar 600 jovens servas e camponesas. Embora muitas lendas e mitos a rodeiem, é difícil separar o fato da ficção devido ao sensacionalismo e ao exagero que se desenvolveu ao longo dos anos.


Segundo as histórias, Báthory acreditava que banhar-se no sangue de virgens a ajudaria a manter a juventude e a beleza. Diz-se que ela tinha uma equipe de cúmplices que a ajudaram a sequestrar e assassinar inúmeras meninas das redondezas. Esses crimes ocorreram em seu castelo, o Castelo Cachtice, onde hoje é a Eslováquia.

O número exato de vítimas atribuídas a Elizabeth Báthory varia muito em diferentes relatos, no entanto, é importante notar que esses números são em grande parte baseados em boatos e rumores, pois não foram devidamente documentados durante sua época.


Em 1610, Báthory foi presa e levada a julgamento. Embora ela tenha sido inicialmente condenada à morte, seu status nobre a impediu de ser executada. Em vez disso, ela foi presa em seu próprio castelo, onde permaneceu até sua morte em 1614.

A história de Elizabeth Báthory cativou a imaginação do público durante séculos e ela continua a ser uma figura proeminente na cultura popular, inspirando numerosos livros, filmes e outras obras de ficção. Ela deu origem a uma lenda folclórica popular de que ela era uma vampira.

Voltando à ficção

O filme segue uma premissa semelhante à de seu antecessor, girando em torno de um grupo de jovens viajantes que se tornam vítimas de uma organização sádica que oferece a clientes ricos a oportunidade de torturá-las e matá-las. À medida que a história se desenrola, o filme explora as experiências das três protagonistas à medida que caem nas garras da organização. Testemunhamos os eventos perturbadores que elas enfrentam e as escolhas que devem fazer para sobreviver. O filme também investiga as motivações e os antecedentes de alguns clientes da organização, esclarecendo seus desejos e motivações distorcidas.

Embora filmes gore recebam críticas, principalmente de pessoas que entendem de cinema, é importante perceber que a proposta do filme é o que o torna gore, ou seja, se quer algo diferente disto, procure em outro lugar, afinal, não é muito inteligente, por exemplo, buscar um filme de ação, ir assistir ao emocionante drama "Como Era Verde o Meu Vale", e sair reclamando de sua sessão.

🔷Albergue 3 (2011)

Poucos dias antes de seu casamento com Amy (Kelly Thiebaud), Scott (Brian Hallisay) vai para uma despedida de solteiro em Las Vegas com seus amigos Mike (Skyler Stone), Justin (John Hensley) e Carter (Kip Pardue). Em um clube de striptease, eles conhecem as acompanhantes Nikki (Zulay Henao) e Angela (Evelina Oboza), que convidam os quatro amigos para uma festa nos arredores de Las Vegas. 

Na manhã seguinte, os amigos percebem que Mike está desaparecido. Um pouco depois, eles descobrem que Nikki também desapareceu, então Scott, Justin e Mike saem com Angela para procurá-los. Eles são sequestrados por um grupo de homens e percebem que estão sendo colocados à disposição dos membros de um chamado Clube de Caça de Elite, cuja necessidade é deixar suas fantasias sádicas liberadas...

Nas entrelinhas

É o primeiro filme da série que não será dirigido por Eli Roth. Roth tem a filosofia de que nenhuma série de filmes deveria ir além de dois. E é o primeiro filme da série a não ter estreia nos cinemas, o que praticamente garante o filme como sendo de qualidade inferior.

A direção foi para Scott Spiegel. Ele é mais conhecido por suas colaborações com o diretor Sam Raimi e o ator Bruce Campbell. Ele co-escreveu o roteiro do filme de terror cult “A Morte do Demônio” (1981) ao lado de Raimi, que se tornou um filme altamente influente e amado dentro do gênero. 

Spiegel também co-escreveu e dirigiu o filme terrorista “Violência e Terror” (1989), que conta a história de um grupo de funcionários presos dentro de um supermercado e caçados por um misterioso assassino. O filme virou cult ao longo dos anos por suas mortes inventivas e atmosfera de suspense. Porém, após o trabalho fraco e esquecível em Um Drink no Inferno 2: Texas Sangrento, era de se esperar que O Albergue 3 viesse para confirmar que não tinha talento ou que Um Drink no Inferno 2 foi apenas uma patinada.

Se olharmos a recepção do público alvo e o fato de que ele não dirigiu nada desde então (O Albergue  foi lançado em 2011), temos nossa resposta.

O estranho facínio pelo mórbido - Parte 3

Se pensarmos na praticidade da execução, chegaremos à conclusão de que violência gráfica funciona de modo mais simples e rápido do que algo mais sutil ou elaborado, como um terror sobrenatural ou criminal. Tão aterrorizador quanto a possibilidade de uma morte induzida, é uma morte antecedida por dores e sofrimentos além da compreensão de uma pessoa comum. 

É desse modo aparentemente básico que o gore funciona, provocando, primeiramente, o desconforto visual e, em seguida, valendo da competência individual de cada título, conseguindo com que o espectador se coloque na pele da própria vítima. Portanto, não se limita a um desejo sádico, mas sim a jogos de masoquismo psicológico.

Obviamente também existe uma satisfação do sadismo em todo ser humano, que é reprimido e, muitas vezes, negado: assistir a um filme gore seria um modo de liberar este desejo e a agressividade natural e primitiva da nossa natureza que não é bem aceita pelos valores sociais e morais com os quais convivemos desde o nascimento. 

Torture porn

É um termo usado para descrever os filmes de terror que se concentram em violência gráfica extrema, sangue e atos sádicos. Esses filmes geralmente retratam cenas de intensa tortura física, mutilação e sofrimento. O termo é frequentemente usado em tom pejorativo, descrevendo filmes que priorizam o valor do choque e a violência explícita em detrimento do enredo, do desenvolvimento do personagem ou de outros elementos normalmente associados à narrativa.

É importante observar que o termo é subjetivo e pode ser controverso. Alguns argumentam que rejeita ou banaliza injustamente o mérito artístico, ou as intenções de certos filmes, enquanto outros o verem como um descritor preciso para um tipo específico de subgênero de terror.

O termo surgiu com o crítico David Edelstein depois do primeiro Albergue, mas que ganhou poder retroativo com “Jogos Mortais” (2004), de James Wan, lançado um ano antes. Esses filmes, juntamente com outros que se seguiram, muitas vezes apresentam armadilhas mortais intrincadas e elaboradas, intenso sofrimento físico e psicológico e cenas explícitas de mutilação.

Embora esses filmes possam ser vistos como um afastamento dos filmes de terror tradicionais que dependem de suspense, atmosfera e elementos sobrenaturais, eles inegavelmente encontraram um público e geraram discussões dentro do gênero de terror.

E voltando ao Albergue...

A história toma um rumo diferente dos filmes anteriores. Em vez de seguir a mesma fórmula de viajantes desavisados ​​serem vítimas de uma organização sádica, o filme apresenta um novo grupo de personagens e muda o cenário. Desta vez, a história gira em torno de uma despedida de solteiro em Las Vegas, onde o noivo e seus amigos se envolvem em um jogo mortal orquestrado por um clube.

Tal como acontece com os outros filmes da série, o terceiro capítulo contém violência gráfica e cenas perturbadoras, tornando-o adequado para o seu público alvo. O Albergue 3 reforça a ideia de que devemos sempre esperar menos dos filmes para a diversão ficar maior. 

A expectativa é uma vilã mais avassaladora que os sádicos do albergue. 

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